EDITORIAL: ALGUMAS VEZES, A POLÍTICA É PAIXÃO PURA
A política é uma das grandes paixões das populações dos estados democráticos. No Brasil, assim como o futebol, a política também é capaz de mobilizar multidões, principalmente, em época de eleições.
Na verdade, nada explica de forma clara e racional porque essas duas atividades conseguem envolver tanto os indivíduos. Na política, a maioria das pessoas envolvidas não conhece os candidatos, não tem expectativa de ser diretamente ajudada por eles, e não é filiada a qualquer partido político. No futebol, de jeito idêntico, o torcedor raramente tem acesso a seus ídolos, e nunca frequenta as dependências do clube de seu coração.
Portanto, somente a necessidade de viver com fortes emoções pode explicar por que as pessoas entregam-se tão intensamente às paixões que a política e o futebol são capazes de despertar, no ser humano.
A paixão política é mais visível nos pequenos e médios municípios do interior do país, onde as pessoas aguardam com certa ansiedade a chegada do período eleitoral para externarem a força de seus sentimentos. A paixão por um clube de futebol é mais intensa nos grandes centros, onde estão as agremiações mais queridas, e os torcedores acabam-se encontrando nos estádios, para assistirem aos jogos mais importantes de seu clube.
No interior, a política vincula as pessoas a grupos políticos, que são criados para dar sustentação às lideranças. São entidades informais, que trabalham sem programa e sem ideologia, mas que conseguem de certa forma agrupar as pessoas em torno de seus líderes e em defesa das candidaturas lançadas às disputas eleitorais. A forte adesão do eleitor ao grupo, acaba levando-o a uma paixão sem limites que, em alguns casos, pode mudar o seu comportamento em relação as pessoas com que convive no mesmo ambiente e, às vezes, há muito tempo.
É uma paixão doentia, até mais radical e danosa do que a própria paixão pelo futebol. Não são raros os casos em que famílias e pessoas de grupos políticos diferentes passam de simples adversárias políticas a terríveis inimigas. Não se falarem ou deixarem de relacionar-se é tão comum que nem chama mais a atenção de ninguém. Muitas vezes, são amizades antigas que se findam, apenas porque as pessoas estão em lados políticos diferentes.
No futebol, os torcedores não ficam inimigos uns dos outros, porque torcem por clubes diferentes. Mesmo, nas grandes cidades, onde as disputas levam multidões aos estádios, a rivalidade concentra-se apenas naquele instante, em que o jogo acontece. Passado este momento, os torcedores voltam aos seus afazeres e, às vezes, no dia seguinte, alguns gozam da cara do amigo ou do colega, porque seu time perdeu.
Mas, na política do interior, as coisas são realmente diferentes. Poucos respeitam o direito das pessoas divergirem-se politicamente ou de ter o seu próprio partido ou grupo político ou, então, de manifestar-se publicamente em favor de seus candidatos.
Durante o período eleitoral, quando os políticos são eleitos para representar ou governar o município, a paixão política aflora nas pessoas diretamente envolvidas no processo, com uma força admirável.
Nesse exato momento, elas esquecem tudo o que construíram em termo de relacionamento humano para, até com certa imprudência, defenderem os seus candidatos. Em momento algum, elas param para pensar que esse comportamento incivilizado pode acarretar-lhes danos irreparáveis.
Quem habita as pequenas cidades do interior, já viveu ou presenciou esses momentos em que famílias e pessoas transformam-se em autênticas inimigas, apenas porque cada uma quer exercer o seu direito de pensar e votar politicamente diferente.
E o mais interessante é que as pessoas sabem que, nesses casos, não estão agindo corretamente. Mas, mesmo assim, insistem em continuar pensando e agindo do mesmo jeito, embora ainda saibam que nenhum líder ou candidato merece tamanha entrega pessoal.
Basta um rápido retrospecto a respeito da vida política de qualquer liderança ou candidato para que se veja a distância que existe entre o que ele diz ser e o que, realmente, é. Na realidade, no Brasil, ficou muito difícil crer e confiar nos políticos. Eles não conseguem corresponder as nossas expectativas e nem representar os nossos sonhos. A maioria deles prefere agir em causa própria, usando o cargo que administra ou a função que exerce em benefício de seus próprios interesses políticos e financeiros.
Essa é, de fato, a grande razão por que cada eleitor deveria repensar com maior cuidado e mais amor próprio a respeito da entrega politica incondicional que faz ao seu líder político ou aos candidatos. Nada a justifica, principalmente quando velhas amizades e grandes relacionamentos são sacrificados em nome dessa irracional paixão política.
Para exorcizar essa paixão que envolve tanta gente simples e inocente, é recomendável o uso do bom senso e de uma reflexão a respeito dos verdadeiros valores que cada indivíduo deve buscar para si.
Texto: Djalma Figueiredo