Mais uma vez, o governo federal anunciou medidas de incentivo ao consumo de veículos. É o sétimo que  acontece, a curto prazo, no país.  E, como sempre, bastou a indústria automobilística correr à Brasília, dizer que os pátios das montadoras estavam cheios, para  o governo anunciar imediatamente um novo pacote de  socorro ao setor.

Por aí, a gente percebe que, de fato,  o país não tem uma política industrial abrangente,  mas, apenas, uma política voltada para a indústria automobilística.

Em qualquer país desenvolvido, quando há grandes estoques  de mercadorias, as empresa reduzem os  preços para conseguir vendê-los logo. Aqui, não! Pelo menos, com a indústria automobilística que prefere ir  ao governo solicitar a  redução de impostos  para o seu produto, e o aumento do crédito para o consumidor.

E, desta vez, o governo  foi mais generoso com a indústria automobilística do que de costume, porque, além de lhe conceder  o que pediu, ainda reduziu o compulsório dos bancos para liberar 18 bilhões de reais, somente para os brasileiros comprarem  carros novos.

Portanto, se você não tem veículo novo e deseja adquirir   um, chegou o momento certo de  correr a uma concessionária  e fazer a sua escolha. Não dá para perder a promoção que o governo está  realizando  com o dinheiro suado do povo que, certamente, vai fazer muita falta à saúde, à educação e à segurança pública  dos brasileiros.

Não fique preocupado com a possível inadimplência de suas prestações mensais. No mercado de veículos, o estoque de dívidas, com atrasos das prestações acima de 90 dias, já está em 10,5 bilhões de reais e, ate  15 dias, já ultrapassou  os 25 bilhões. Por isso, não há razões maiores para  você preocupar-se com o possível atraso de sua obrigação.

Nesse momento, lembre-se que  o governo, que é dono do dinheiro,  também não está preocupado. A prova é  que, apesar do valor assustador da dívida do setor automobilístico,  ele aumentou a oferta de crédito ao consumidor e, consequentemente, incentivou  ainda mais  o acúmulo da dívida.

Mas, enquanto o governo mostra-se demasiadamente generoso para com a indústria automobilística, ele tratou de  reduzir o investimento público em 2012, se comparado ao de  2011.  Deixou, assim, de realizar uma política capaz de proporcionar ao país um crescimento sustentável e, com ele, beneficiar a indústria em geral, para por em prática uma política voltada exclusivamente ao benefício de  um único setor industrial.

Comprar carro novo e mais barato é bom, é ótimo. Mas, o governo precisa entender que isso só deve  ocorrer  em razão de uma política  que atenda a indústria brasileira como um todo, e não, somente, a indústria automobilística, como se ela fosse a única do país.

Portanto, já passou da hora do governo assumir que o grande  problema da indústria brasileira é a falta de competitividade. E que, para   criá-la, o governo precisa  fazer  o que  deixou de  realizar ao longo dos anos, ou seja,   uma responsável revisão dos impostos por meio de um reforma tributária,  e pesados  investimentos  em infraestrutura no país.

Sem essas medidas não há como fazer a indústria brasileira tornar-se competitiva e, assim, poder disputar mercado com as indústrias internacionais. Não é possível, por exemplo, baratear o custo da energia que onera demasiadamente a indústria, porque  a razão de  seu elevado  preço  são os impostos que vêm  embutidos na fatura do produto.

Existe outro fator que deveria ser preocupante para  o governo brasileiro, e não o é.   Falo do  endividamento da renda mensal do brasileiro que passou de 15% em janeiro de 2005 para 22,4% em fevereiro de 2012. E é bom lembrar de que, em 2008, quando a economia americana entrou em crise, o mesmo indicador apontava para esse país um endividamento semelhante de apenas 14%.

Da renda do brasileiro, após a saída do valor comprometido com o endividamento, o que fica  é para pagar habitação, transporte, educação, alimentação, laser, água, luz e outras obrigações. Por isso, é preocupante que o governo incentive um endividamento maior do que o já existente.

Mas, sem atentar para os riscos do aumento da dívida do brasileiro e para os  benefícios concedidos apenas a um setor da indústria nacional, o governo alega que o pacote de estímulo ao consumo  é  para motivar  o crescimento econômico do país que, em razão da crise na Europa, tende a sofrer  alguma retração.

Todavia, gostaria de ver no pacote baixado qualquer enfrentamento aos problemas estruturais do país, porque são eles que tiram a competitividade da economia. Mas, vejo apenas uma ajuda oficial a indústria automobilística que reclama quando o dólar está alto e quando os pátios estão cheios de automóveis.

Texto: Djalma Figueiredo